quinta-feira, 17 de março de 2011

SOLIDARIEDADE

S O L I D A R I E D A D E
“Qualidade de solidário
Que tem interesse e responsabilidade recíprocos
Mutualidade de interesse e deveres
Compromisso pelo qual as pessoas se obrigam
 umas pelas outras e cada uma delas por todas.”


Por iniciativa de uma das irmãs, daquele que foi um modesto Convento no qual, como em tantos outros, vendiam-se licores e biscoitos amanteigados, aos poucos, surgiu uma Escola que, pela qualidade do ensino, tornou-se um Colégio particular muito reputado que, também, sustentava um setor de educação primária totalmente gratuita.

Com a colaboração dos pais sempre solicitados à participação, muita gente de fibra, de caráter inquebrantável, de alto valor profissional e ético, foi moldada e formada, com base sustentável, para a vida, através do incansável trabalho da Irmã-Diretora que selecionava sua equipe no detalhe.

Os funcionários, quase tão antigos quanto a própria Instituição orgulhavam-se do Colégio e da confiança depositada em seu trabalho.

Aos poucos, o imenso terreno foi ocupado por alguns prédios escolares e um enorme auditório e palestra para o ensino da Ginástica e prática de esportes. Muitos eventos aconteciam, seja nas dependências do complexo, seja por meio de excursões e participações externas. Ouviam-se as risadas, os violões, a garrulice dos pais.  O ambiente era de alegria e felicidade.

Repentinamente a felicidade foi cortada. O enorme jardim, antes aberto ao público, foi interditado ao mesmo. As belíssimas primaveras roxas, laranjas, rosas, e brancas que insistiam em ornar a fachada do Colégio acima do muro que o cerca, foram barbaramente decepadas a golpes de facão. A altura acima do muro, até então ocupada por flores, foi preenchida por tijolos e acima destes foram passados  fios de cerca elétrica. Em lugar das acolhedoras e poéticas flores, fios eletrificados:  a barreira, a agressividade.

Santo Deus! O que está acontecendo?

Resposta:
Nem sempre Deus é Santo!

Autoridades religiosas oriundas de um imponente escalão, até então praticamente desconhecido ou sentido, importam, de outro país, uma freira para exercer as funções de Diretora. A maioria das irmãs foi enviada a outras destinações.  Algumas, poucas, foram exiladas em uma casinha localizada num beco ao lado do complexo. A Irmã-Fundadora foi sumariamente demitida e despachada. A situação foi tão grave e tão drástica que, penalizados, inúmeros pais reuniram-se e recorreram, junto às autoridades públicas, pelos direitos civis usurpados das freiras, algumas das quais idosas e/ou adoentadas.

O setor escolar gratuito foi extinto.

Tenso, o ano-escolar foi iniciado, sob a égide da incerteza, da desconfiança, da tristeza e da saudade dos tempos áureos. A nova administração religiosa, inicialmente, havia, inclusive, impedido a continuidade do processo de matrícula. Isto foi há dois anos. A beleza feneceu, a alegria evadiu-se, a felicidade esvaneceu.

O Colégio mudou de nome e acredito que o nome atual signifique Jesus. Ao lado do portal em que o novo nome do Colégio está gravado com letras de inox, uma placa.  Nela lê-se textualmente:


“Uma escola para aprender a conviver com solidariedade.”

“Educação integral de qualidade para a vida florescer.”



Solidariedade? Convivência com solidariedade?! Certamente, as irmãs.  Em sua nova casinha purgadora.

Em tanta mudança, solidário foi o comportamento dos pais. Interesse e responsabilidade recíprocos, mutualidade de interesse e deveres foram vistos, ao longo dos anos, no crescente florescer desse educandário que portava o nome de uma Santa, antes da reforma radical.

Florescer simbolizado pelas primaveras exuberantes que, anteriormente, enfeitavam a fachada do educandário. E, percebam quanta simbologia! “Primavera”; estação do ano caracterizada pela renovação da vegetação.  Logo, renovação da vida através de nossos filhos, as crianças. “Primavera” estação das flores.  Logo, a juventude, a primavera da vida.

Compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas pelas outras e cada uma delas por todas, ou seja, solidariedade.  Não foi percebida em sua integralidade.

Porque a integralidade não pode fazer parte, apenas, da metodologia qualitativa de um educandário onde, sim, a vida floresceu a todo vapor e com todo o vigor, conforme representado pelas exuberantes primaveras.

A integralidade é representada por uma postura de vida coerente, compromissada com todas as esferas sociais e não apenas com aquela cercada e protegida por fios elétricos e áridos muros, qual muralhas de presídio. 

A vida floresce apenas onde há o húmus representado pela convivência, pelo intercâmbio, pela confraternização e pela verdadeira pratica solidaria entre as diversas camadas das múltiplas esferas da comunidade societária humana local e/ou global, integrada com as demais sociedades da fauna global integral.

Que este nosso desabafo seja, apenas, uma pequena demonstração de pesar e, ao mesmo tempo, sirva de estimulo para as irmãs totalmente desterradas do habitat material, intelectual e espiritual tão bem idealizado, forjado e construído ao longo de inúmeros anos de disciplina e sacrifício que tanto as honrou e honrou nossa cidade. 

Felizmente, então, a missão que haviam escolhido, gratificava-as através do reconhecimento e profundo respeito de toda uma comunidade incluída a vizinhança. Comunidade que, diretamente, com elas convivera, na lojinha de artesanato, no desfrute dos saborosos licores e biscoitos, nos educandários, seja o gratuito, seja o pago, em que as famílias, também, encontravam acolhida.

Para elas o Santo Deus jamais deixará de ser Santo, pois Ele sempre continuará a agraciá-las com as suas bênçãos e, dentre elas, o carinho e o reconhecimento irrestrito dos pais e alunos da insigne instituição a que deram luz, iluminadas por Ele, através do Amor incondicional a toda e qualquer criança, de toda e qualquer camada socioeconômica da população soteropolitana.

Silvia Vannucci Chiappori
17.03.2011



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