sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

FEIRA DE SÃO JOAQUIM


Um casal de turistas franceses, com idade média de 67 anos, conhecedores de  algumas palavras de espanhol, contratou um motorista para levá-los a passear, durante seis horas, por Salvador, excluído o Centro Histórico que já conheciam.

Seis horas! O suficiente para terem uma boa visão panorâmica da Cidade do Salvador e, até, de algum museu. No seu itinerário constavam as praias da Ribeira, a Igreja do Bonfim, o Forte de Monte Serrat, a Feira de São Joaquim, o Farol da Barra, e museus como o “Rodin” e o “Carlos Costa Pinto”. E, por que não o Dique do Tororó, o Terreiro da Casa Branca e o Templo de Iemanjá? Ou, o Porto da Barra?

Do selecionado, o que mais causa impacto é a Feira de São Joaquim. Como poderia o casal, com mais do que meia-idade e claramente sem costume de ir a feiras de rua do gênero das nossas, adentrar-se, sozinho, na Feira de São Joaquim ?

O primeiro impacto será o causado pela sujeira das ruas? Ou, pela confusa profusão de produtos exibidos para vendagem e expostos com certa falta de “ordem setorial”.  Os inúmeros becos, que nos desorientam e fazem com que nos percamos, absorvidos que estamos a admirar tanta profusão de mercadorias. Seriam eles o impactante?

O segundo impacto será o causado pelo belo colorido da grande variedade de frutas e verduras? Ou, será a variedade de Santos, e outros afins, das inúmeras vertentes religiosas, representados em esculturas de todos os tamanhos e de todos os gostos? E, como não impactar-se com a variedade de pozinhos e velas para todos os momentos, para todas as necessidades e para todos os tipos de crentes?

O terceiro impacto será o causado pelos artigos em palha? Ou, pela cerâmica de barro cozido, em diferentes tons de vermelho-marrom, muitas decoradas em branco com motivos florais? Para o europeu, a quem cozer em utensílio de alumínio está proibido há longa data, a rica coleção de panelas de alumínio e outros utensílios causam impacto? Serão as especiarias vendidas a preços irrisórios? Ou, o impacto será visual ou, até mesmo, gustativo diante da graciosa variedade de pimentas multicores?


O quarto impacto será o causado pelos pátios cobertos com cana de açúcar e ervas para todos os tipos de tisanas destinadas às mais variadas finalidades? Ou, ainda o “Aloe vera” vendido in natura? Surpresa para quem só o conhece, por leitura, nas embalagens de produtos que o contém.

O quinto impacto será o de tantas cabras e cabritos expostos ao sol escaldante, próximo à água da Baía, sem que sua sede seja saciada. Ou, serão as grandes quantidades desses animais, ou de porcos, apinhados em cercados rudimentares? Quem resiste ao impacto de ver uma cabra amarrada pelas patas dianteiras e traseiras, colocada, como um saco de farinha, em um carrinho de mão, a maior parte das vezes, com a cabeça pendente para fora do mesmo? Onde a beleza de tanta crueldade? Onde a beleza, ante a patente resposta de que se destina ao sacrifício?

O sexto impacto, mais comum, mas não menos doloroso é observarem-se as gaiolas superlotadas de frangos, que não conseguem, sequer, movimentarem-se, e onde não há qualquer vislumbre de água para beber. Esses animais passam aí alguns dias e somente sobrevivem “de teimosos”. Para quê? Amarrados singularmente, ou a dois ou, ainda, a três serão transportados para uma panela!

O sétimo e, talvez, ultimo impacto será, por acaso, o setor das carnes? É impactante inalar o perfume exalado pelas carnes frescas, vísceras de boi, de porco, de cabrito, testículos, olhos de boi, orelhas e outros salgados de porco, salsichas, lingüiças, carne de sol, charque e defumados ?

Como não sentir-se impactado diante das cabeças degoladas de porcos e de vacas, expostas na íntegra, silenciosamente a nos perguntarem, com seu olhar profundo, mudo e perplexo, o por quê de tanto sofrimento? O por quê de tanta falta de misericórdia e compaixão? O por quê de tantos maus tratos? Qual o porquê dessa guerra diária dos homens contra os animas? Que ente tão superior é esse homem? Não fomos todos criados pelo mesmo Deus?

Bem fizeram os turistas franceses ao desistirem da visita a São Joaquim.

À entrada, impactaram-se com o peixe fresco sendo despedaçado em postas, lado a lado com a vendagem de flores brancas.

Silvia Vannucci Chiappori, 04.02.2011  


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