quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

De Ratos e de Homens - 26.01.2011

Há alguns meses, condoída pela sorte de um animalzinho recém nascido, uma senhora adotou um rato acreditando tratar-se de um filhote de cão. Tinha o maior carinho pelo mesmo. Foi, até, assunto para os noticiários da TV.  Até que não houvesse a desconfiança da verdadeira identidade do pequenino. Isto acontecido, o noticiário e a Sra. saíram do ar. Nenhum informativo acerca do final da história.

Vergonha? É possível...Como pode alguém, com olhar amoroso e com desmesurada compaixão, afeiçoar-se a um rato?  Antes fosse um cão como pretendiam alguns...

Contudo, em Salvador, entre cães e ratos não há muita diferença. Estão aí, aos montes, circulando pelas ruas.

Cães abandonados por seus donos.  Sofrem todo o tipo de privação e maus tratos para permitir que seus donos possam curtir um pouco mais das férias, dos bares, das viagens, da tranqüilidade de não ter como dependente um animal que, pequeno, era tão engraçadinho, tão queridinho, tão mimado, tão fofo. Tudo o que são nossos filhos pequenos mas que, ao crescerem, já não são exatamente a mesma coisa.  Ao contrário dos cães, não se podem jogar na rua pelo simples fato que eles, nossos filhos, podem falar.

Falam a nossa língua. A língua do ser humano.  Humano?! Onde a compaixão? A língua do ser civilizado. Civilizado?! Abramos um jornal. Qualquer. De qualquer cidade, de qualquer país do mundo. Não será preciso espremê-lo, pois, já ao abri-lo, dele jorrarão lágrimas, suor e sangue das vítimas de outros tantos "humanos" que maltratam, escravizam e matam os primeiros.

Como confundir um rato com um cão?! Em Salvador, não é difícil. Ratos viraram, até, atração turística. Certamente, a razão pela qual são bem tratados e nem passa pela cabeça da administração pública o extermínio dos mesmos, pois maltratar animais É CRIME.

Explico.

Há alguns dias, na qualidade de Guia de Turismo, após havermos feito uma parada clássica no Dique do Tororó,  fiz questão de, passando pelo Terreiro da Casa Branca, levar meu casal de turistas conhecer a Casa de Iemanjá, no Rio Vermelho.

Dia lindo. Tudo maravilhoso e, para completar, o inevitável. Assisto, semi-paralizada, ao turista que, sem se decompor, hesitava sobre qual lado deveria deixar um rato passar. E, este, igualmente.  Excelente anfitrião, dançava frente ao turista imaginando de qual lado seria interessante fazê-lo passar.

Cena grotesca? Dantesca? Ou, simplesmente, vamos convir, cena de uma cidade que ama e cultiva os seus animais? Com uma leve diferença. Os ratos proliferam e multiplicam-se, pois encontram farta comida e aconchego nos subterrâneos da cidade. Enquanto isto, os animais abandonados morrem de fome e de maus tratos, o que não é, convenhamos, o caso dos ratos. Benditos seja eles!!!

Tão benditos que Segunda-Feira, 24 de Janeiro, acompanhei um novo casal de turistas. Desta vez ao Farol do Monte Serrat. Este, de per si, um local bendito pelo panorama que descortina e pela presença da pequena jóia que é a Igreja de Monte Serrat, embora, atualmente, estropiada pela queda do majestoso adro. Entre parêntesis, queda fruto do cultivar de cupins aí instalado e, naturalmente, bem protegido.  Que animaizinhos gananciosos! Não bastava alimentarem-se? Precisavam desgastar as vigas a ponto de fazer desabar o todo?!

Não obstante, o Monte Serrat é um local paradisíaco para o soteropolitano, para os turistas que além de usufruírem do panorama, da brisa da Baia e da tranqüilidade do mar puderam, ainda, deleitarem-se com o espetáculo de um rato que, nos rochedos, à beira da água, juntamente com cinco pombos, saboreava resíduos de uma oferenda a Iemanjá. 

Taadinhos! Todos eles tinham os pés dentro d´água. Taadinhos?! Não! Que sorte! Com o calor e o Sol de 34º C, mais uma vez, eram benditos.  Benditos por viverem na Cidade do Salvador, Benditos por refrescarem-se os pés, Benditos por poderem saborear do alimento dos deuses, Benditos pois que abençoados por Iemanjá.

E, por favor, não me corrijam. Pés, pois tratava-se de inocentes criaturas aproveitando do pouco e do melhor que a vida podia lhes oferecer naquele momento. Patas são privilégio de muitos "humanos", não tão sortudos, vez que perderam a transparência da alma.

Assim, justo é classificar Salvador como cidade hospitaleira, histórica, paradisíaca, com aculturações mistas, miscigenadas em que há um profundo respeito pela natureza de cada ser, conforme sugere seu nome, Cidade do Salvador, e conforme sugerem os santos da Baía de Todos os Santos.

Assim, Viva a Bahia! Viva os Ratos! Abaixo os Homens!

E, que o Axé sobreviva. ACIMA DE TUDO.



Um comentário:

  1. Silvia querida, que bom ler seu texto que tão bem retrata a situação de abandono de nossa cidade, além do desamor dos homens por seus semelhantes e animais. Falta a sensibilidade, para reconhecer que bichos são feitos de carne e osso e, portanto, sentem dor. É uma tristeza ver tanto animal largado pelas ruas da cidade a mercê da crueldade de alguns ditos "humanos".

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